
Minha intenção em ser rico já passou, embora nunca o fui. Ostentar pecúlio, só se ganhar na loteria — para mim talvez seja mais difícil, posto que, até então, fiz somente três apostas na sorte: matematicamente minhas chances são baixíssimas.
Em minha adolescência os desejos eram maiores do que as posses, isto faz até sentido. Agora maduro, noto que os desejos diminuem para se encaixar com o encurtamento da vida e com as deliberações e contingências do momento. A avareza diminui à medida em que a idade avança, ainda que, para algumas pessoas, ela é ativa até a hora da morte. Nem sempre o amadurecimento é sinônimo de equilíbrio com as posses.
Quando se tem consciência da importância em viver com qualidade — ante ao desejo de querer mais e mais coisas — começa-se a contestar a real necessidade de certos acessórios. Não chega a tanto, mas é quase o estilo de vida dos minimalistas, pessoas que diminuem drasticamente os níveis de consumo ao adquirir somente os objetos necessários para uma vida plena.
Neste contexto, o economizar também entra em cena; e é daí que coisas engraçadas começam a aparecer. Entre elas está o cuidado em não desperdiçar, utilizar o máximo possível até que o próprio objeto diga para você: “Ei, chegou a hora da despedida, pode-me soltar”. Alguns dizem que isto é coisa de quem é pão-duro, eu digo que isto é economizar — ambientalmente falando: é a prática do não desperdício.
Pensando nestas ideias chego a seguinte tese:
Prefira viver com aquilo que se tem, e o que for preciso adquirir que seja por pura necessidade. Pautar a vida pelo equilíbrio evitará muitos transtornos. O controle dos interesses colocará você no cerne da existência e impossibilita seu apego ao futuro. A máxima popular (não ecológica), “mais vale um pássaro na mão do que dois voando”, resume tudo.
Pois então, mantenha a sua atenção nos desejos, estes merecem rédeas curtas (ainda que tenha metas de longo prazo). Os desejos são aves de rapina (rapina, em latim, significa: raptar), eles nos capturam, muitas vezes nos sugam da existência do momento. Esquecemos de viver o presente, e optamos por sobreviver num agora sem sentido, à espera de um futuro.
Nesta circunstância deparamos com a famosa expressão de Sêneca, “enquanto se espera viver, a vida passa”. A isto se soma um célebre provérbio budista, “é preciso aprender a viver como se o instante mais importante da vida fosse aquele que você está vivendo no exato momento, e as pessoas que mais contassem fosse as que estão diante de você. Porque o resto simplesmente não existe: o passado não está mais aqui, e o por vir ainda não chegou”.
N. Tommaseo nos alertava quanto aos nossos interesses: “a mais difícil das coragens e, ao mesmo tempo, a mais necessária, é a coragem de resistir aos desejos”. Platão já dizia que só desejamos o que não temos. Desta forma, e segundo as ideias de Clovis de Barros, “a vida valerá tanto mais a pena ser vivida quanto menos o corpo e seus apetites derem as cartas”.
Portanto, “a prudência”, diz Sponville, “é o que separa a ação do impulso, o herói do desmiolado”. Ele ainda acrescenta, ao citar Freud, que para praticarmos a prudência deve-se “desfrutar o mais possível, de sofrer o menos possível, mas levando em conta as disposições e incertezas do real”. A despeito de, e segundo o mesmo autor, “a prudência não impede o risco e nem sempre evita o perigo”. O pensamento socrático diz que a essência da qual buscamos não está no mundo, mas em nós mesmos.