
As crises mundiais sempre existiram, ocorrem de tempos em tempos, são cíclicos, passam por ondas crescentes de intensidades e descambam para o fim até extirpar (ou transformar) o causador da crise. Cada evento tem o seu tempo de validade, podem duram anos, séculos, ou até milênios. Heráclito, na Grécia antiga, comparou esse movimento do mundo a um fogo que se mantinha aceso por um certo tempo e depois apagava-se, tornando a acender novamente. Empédocles atribuiu as mudanças no universo ao fluxo e refluxo de forças que se complementavam; estas forças ele chamou de “amor” e “ódio”.
São múltiplas as crises que nos assolam — entre elas temos a CRISE INSTITUCIONAL, bastante tenebrosa atualmente, por isto será o foco deste texto. A descrença nas instituições, onde há rupturas entre governantes e governados, está levando parte da humanidade ao submundo, ao lado sombrio da força. A ruptura é mais profunda, tanto em nível emocional quanto cognitivo, disse Castells. Em várias parte do mundo (Estados Unidos, México, Europa, Brasil entre outros) a democracia liberal está perdendo terreno para o extremismo.
Mas…onde começou tudo isso? Estudiosos destacam como pano de fundo a globalização da economia e da comunicação. Esta crise se arrasta, não de forma homogênea, desde o século XV até nossos dias. Trouxe desestabilidade aos Estados-nações, pois estes não conseguem suplantar certos problemas globais (a violação aos direitos humanos, crimes econômicos, desrespeitos ao meio ambiente, terrorismo, entre outros). Atualmente a globalização gera profunda desigualdade econômica (os mais pobres ficam cada vez mais pobres e os mais ricos ficam cada vez mais ricos), aumenta a crise identitária, aumenta a xenofobia e a intolerância, provoca a deslegitimação da política pela total ou parcial ausência da ética e da moral por parte de alguns agentes políticos.
A crise institucional abre brecha para políticos oportunistas e inconsequentes, gente de pensamento e ato maquiavélico, gente de fala tosca. Mas quero chamar atenção para o seguinte ponto: não se pode dizer que todos os políticos são imorais e antiéticos por conta de alguns facínoras eleitos pelo povo. Generalizar induz a erro, e na política a generalização contribui para erros perigosos e de efeitos desastrosos. Toda unanimidade é burra, disse Nelson Rodrigues. Na mesma linha de pensamento está Llosa ao declarar que toda generalização é falaciosa, e não se pode pôr todos igualmente no mesmo saco. Compreender o significado disso evita-se possíveis desastres.
É fácil perceber o falso político, principalmente se suas atitudes forem extremistas. Basta acompanhar com atenção a sua oratória, muitas vezes carregada de deboches, mentiras e preconceitos (segregação de raça, de costumes e de ideologia de gênero), seus trejeitos e a sua maneira desajustada e torpe em lidar com o contraditório. Tudo isso são os motes que confirmam o ser energúmeno que se apresenta.
Dentre vários políticos extremistas (radicais) — Éric Zemmour e Marine Le Pen, na França; Giorgia Melini, na Itália; o partido Vox, rotulado de extrema direita, na Espanha etc. — destaco aqui somente dois casos, a nível de presidente, da política imoral e antiética. O primeiro é o ex-presidente Donald Trump. Em sua campanha ao cargo de presidência atacou a imigração muçulmana e, ainda, os mexicanos — chamando-os de ladrões, estupradores e narcotraficantes. Reafirmou sua xenofobia quando prometeu construir um muro ao longo da fronteira com o México.
Fez várias declarações racistas ao afirmar, em uma entrevista à Fox News em 2021, que centenas de milhares de pessoas que vão do Haiti para os Estados Unidos estão contaminadas pelo vírus do HIV, na fase mais avançada da doença, a SIDA (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida). Segundo estatísticas do FBI, somente no primeiro ano da presidência de Trump ocorreram aumento de 17% em crimes homofóbicos, xenofóbicos e de racismo. Trump também fez declarações misóginas — em uma entrevista dada ao jornal El País, em 2016, ele sugeriu que as mulheres que se submetem a um aborto deveriam sofrer algum tipo de castigo. O reporte perguntou a Trump se “o homem que engravida essa mulher deveria ser punido”, ele respondeu que “não”.
Nessas atitudes desvairadas, Trump fez florescer os grupos racistas, neonazistas e antissemitas, que haviam ficado escondidos nas sombras da vergonha, e que agora se identificam com a sua fala.
Trump também combateu o uso das máscaras na pandemia, implementou ataques contra a vacina da covid-19, assim como lutou contra as normas ambientais — a saída dos Estados Unidos do acordo de Paris, assinado em 2015, que se comprometia em reduzir as emissões de carbono, responsável pelas mudanças climáticas, assim como a redução da proteção de espécies ameaçadas dos Estados Unidos, e, também, a rever a precarização da Lei de Política Ambiental, e tantas outras medidas tomada que veio a prejudicar diversas áreas das políticas públicas.
Aqui, no Brasil, seguindo quase os mesmos passos do Trumpismo, o presidente da república, Jair Messias Bolsonaro, capitão reformado, preso em 1986 por insubordinação, quase foi expulso do Exército, se vangloria por ser patriota, embora idolatra a bandeira dos EUA, demonstrou ser o presidente de policiais, de caminhoneiros, e de certos grupos de religiosos gananciosos e mentirosos — como por exemplo certos pastores (ou supostos pastores que pregam o cristianismo) de baixa credibilidade moral e ética, nos quais utilizam a igreja como palanque político para adquirirem dinheiro e poder. Não nos custa lembrar a mensagem em Mateus 7:15: [eles] vêm até vós vestidos como ovelhas, mas, interiormente, são lobos devoradores.
Bolsonaro foi deputado federal por 27 anos — com salários de deputado, cerca de R$ 33 mil, nas cifras atuais, mais auxílio moradia R$ 4.253,00 e todos os regalos do parlamento — e somente aprovou 2 projetos, quase todos os projetos que foram apresentados eram inúteis, por exemplo: PL-443/2015, que queria batizar a faixa marítima do país como ‘Mar Médici’. PL 4562/98, cuja ideia era obrigar todos os cidadãos a colocar a mão direita sobre o peito durante o Hino Nacional. PL-1323/95, criação do Dia do Detetive Profissional. PL-73/1995, o Dia do Desportista etc.
A tara deste governo que impulsiona a violência através do discurso e símbolo do ódio — a utilização de personificação que insinua a hostilidade como o “fazer arminha com as mãos”, a utilização de palavras e atos carregados de preconceitos e menosprezo aos que se opõe a eles —, mostra-se capaz de descer ainda mais no abismo da degradação humana.
Basta ver as diversas estratégias criadas em seu governo para promover a discórdia. Um destaque aqui é a formação de grupos, com aval do Palácio do Planalto, promovedores de bestialidade, o chamado Gabinete do Ódio, de onde saem as obscuras ideias das mentes mais vis da república.
Vale salientar que Bolsonaro facilitou a compra de armas pelo tráfico através de colecionadores de armas, os CACs (Colecionador, Atirador Desportivo e Caçador). O presidente Bolsonaro tem demonstrado postura totalitária, de arrogância e antipática diante das normativas da cidadania. É taxado, e já foi denunciado, como homofóbico, misógino, sexista e racista. Promoveu atos, e já se envolveu em alguns deles, contra jornalistas.
A violência, em atos e palavras, é a base do seu governo; os crimes são as normas da sua política. Em seu desgoverno cometeu diversos crimes de responsabilidade e improbidade administrativa como opor-se ao livre exercício do poder judiciário, uso de violência e ameaça para constranger juízes, impedimento do voto por ameaça, cometeu erros gravíssimos por omissões na demora para compra de vacinas, além debochar das vítimas da COVID-19 (em setembro do corrente ano o Tribunal Permanente dos Povos (TPP) condenou o presidente por crimes contra a humanidade, crime este cometido durante a pandemia da covid-19).
A CPI da Covid levantou farta documentação comprobatório da negligência, incompetência, negacionismo e pouca disposição do presidente na tomada de atitude para combater o vírus da covid-19. Também pesa sobre ele os vários registros da imprensa que mostraram a falta de empatia diante das vítimas. A incompetência, negligência, imperícia e imprudência do Ministério da Saúde em combater a pandemia ficaram registradas nas mais de 600 mil mortes.
Em seu desgoverno foi capaz de fazer o que nenhum outro presidente fez, esconder as suas falcatruas e as de seu bando, impondo sigilo de 100 anos no lamaçal de irregularidade e mentiras. Também acobertou os crimes de peculato (esquema de rachadinha), desvio de dinheiro no tal Orçamento Secreto, hoje apelidado de Bolsolão; cometeu crimes de prevaricação, crime de responsabilidade, além da compra de 51 imóveis pagos em espécie, e tantos outros que irão ser investigados.
A fome é marca registrada no desgoverno de Bolsonaro. Em 2014 foi divulgado o relatório no qual confirmava a saída do Brasil do Mapa da Fome, o relatório foi anunciado em Roma, em 16 de setembro de 2014, e foi comemorado com bastante alvitre pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que, desde 2003, havia implementado o programa Fome Zero, na época do lançamento do programa o Brasil atingia mais de 43 milhões de pessoas sem ter o que comer.
Na campanha de 2002, Lula criara o tema “Um Brasil para Todos” e desde então fizera vários programas de transferência de renda. No desgoverno do então presidente Jair Messias Bolsonaro a fome deu as caras. A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) informou que entre os anos de 2019 e 2021 “15 milhões passaram fome. Três em cada 10 brasileiros não têm certeza se vão fazer a próxima refeição”.
Especialistas informaram que esta grave problemática não está relacionada com a pandemia, mas com a ausência de políticas públicas. Sim, é verdade, pois no governo atual as principais áreas como a saúde, educação, ciência, cultura, economia e meio ambiente foram negligenciadas, e o pior, o governo promoveu diversas balbúrdias ideológicas em todo os seus ministérios.
Os descasos agravaram-se na saúde e moradia, por exemplo, na falta de sensibilidade humana ao acabar com o Programa Mais Médicos, o corte de verbas de programas sociais como o Farmácia Popular, o corte de 45% no tratamento do câncer, assim como o corte 95% do programa Casa Verde e Amarela.
Todos estes cortes, além de tantos outros, tiveram uma só finalidade: fazer caixa para o Orçamento Secreto (mecanismo utilizado para facilitar desvio de verbas para compra de votos de parlamentares). Segundo o site Congresso em Foco “os empenhos do orçamento secreto, que entre 2020 e 2022 já ultrapassam R$ 44 bilhões, são indicações de verbas feitas por deputados e senadores sem a necessidade de identificação, possibilitando a indicação de contratos superfaturados de parceiros de cada parlamentar. A ausência de uma assinatura do responsável pela indicação desses recursos é o que o torna secreto”.
Entre os diversos casos de crimes na saúde, o da pandemia da covid-19 foi o mais debatido na sociedade, isto porque a CPI da Covid trouxe à tona a postura negacionista do presidente ao uso das máscaras, ao isolamento social, o atraso premeditado na compra das vacinas, o descaso pela falta de oxigênio para pacientes internados em Manaus.
Drauzio Varella em entrevista afirmou que “o presidente não foi um negacionista, não gosto desta palavra. Ele foi um ativista para a disseminação do vírus”. Em depoimento à CPI da Covid, o ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, afirmou existir o “gabinete paralelo”, que era uma espécie de esquema responsável por orientar Bolsonaro no enfrentamento à pandemia, este esquema utilizava tratamento sem respaldo científico. Outro esquema descoberto pelo TCU foi o superfaturou dos preços na compra de Viagra para as forças armadas.
A educação e a ciência sofreram com escândalos de corrupção e bloqueios de verbas. O esquema “gabinete paralelo do Ministério da Educação”, organizado pelo ex-ministro Milton Ribeiro e pastores Gilmar Santos e Arilton Moura, estiveram nas manchetes dos jornais nacional e internacional. Mais ainda, ocorreram bloqueio de 16 milhões do orçamento destinados a pesquisa nas universidades públicas, e, ainda, cortou dinheiro para as creches.
A gestão da cultura em seu desgoverno foi a pior das últimas décadas. Ocorreram cortes de orçamento, extinguiram o Ministério da Cultura, artistas foram intimidados, ameaçados e censurados; vetou a Lei Aldir Blanc, que destinava, anualmente, 3 bilhões da União a estados e municípios; limitou os cachês de artistas garantido pela Lei Rouanet. Esses, e outros pontos, foram motivos de várias revoltas e manifestações, como a de José Virgílio, diretor e fundador do Instituto de Arte no Dique, que escreveu: “Um país que não preserva sua cultura e sua arte jamais será uma nação”.
O meio ambiente foi alvo da negligência do governo Bolsonaro — merece a alcunha que colocaram nele “Negacionista climático” — a frase “passar a boiada”, dita por Ricardo Salles em reunião ministerial, ocorrida em abril de 2020, deixou os ambientalistas, a população e toda a imprensa perplexos.
O “passar a boiada” significava que o governo deveria aproveitar a pandemia (enquanto a população e os repórteres estivessem ocupados com a covid-19) e tornar menos rígidas as regras relacionadas à proteção ambiental. Podemos citar também a irresponsabilidade criminosa quanto aos cuidados com a Amazônia e o Pantanal, nos quais sofreram com os incêndios em 2020.
Lembro que ao discursar na Assembleia da ONU, em setembro de 2020, o presidente Bolsonaro culpou indígenas, caboclos, imprensa e ONGs pelas queimadas na Amazônia e Pantanal.
Na campanha do 1º turno, assim como na de 2º turno, o presidente Bolsonaro solicitou a limitação de ônibus para que pessoas mais pobres não pudessem ir a seções eleitorais — o ministro Benedito Gonçalves, do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), considerou que tal pedido tenha sido absurdo. O presidente praticou diversos crimes comuns, cometeu infração eleitoral, promoveu Fake News, utilizou-se de mentiras descaradas em suas lives, nas campanhas de 2018 e, sobretudo na campanha atual, de 2022.
Usou, sem escrúpulos, o dinheiro do Orçamento Secreto para compra de voto, burlou leis eleitorais, usou, usa e abusa, do cartão corporativo da presidência, há indícios de que os filhos do presidente estão intimamente ligados a grupos milicianos. A lista das atrocidades, imorais e antiéticas, é imensa (muitos detalhes pulei), mas todos estes pontos são passíveis de serem verificados em farto material jornalístico, documentos oficiais acessíveis na internet, artigos e editoriais na imprensa nacional e internacional. Só não vê que não quer.